Além de mim existem outros alguéns dentro de mim, e esses alguéns conversam entre sim.
O meu lado egoísta se desentende com o meu lado empático e assim todos os meus eus estão em constante conflito e no fim das contas, eu estou sempre me observando e me moldando.
A mitologia é uma paixão antiga, ela me arrasta e me convida para entender a profundidade de ser eu com minhas perguntas e respostas desconectadas com o mundo material em que eu muitas vezes pretendo fugir, e cá estou eu, discutindo com meus eus.
Theseus é um herói que representa a nossa coragem ao se aprofundar em si mesmo, através da mitologia descobrimos que somos um grande labirinto ,ele é a nossa mente com ramificações que ao longo do caminho vamos nos descobrimos, e dentro dessa mente brilhante escondemos algo que precisamos matar, mas não é uma morte comum, é uma luta grandiosa com um monstro que escondemos dentro de nós, o Minotauro representa a animosidade, a nossa impulsividade e a nossa energia sexual desequilibrada, dentro desse labirinto estão os nossos traumas e a origem deles, é a razão desta enigmática construção, porque ao matar o Minotauro nos tornamos heróis, nos tornamos melhores e mais fortes , é no momento em que nos aprofundamos em nós mesmos que conseguimos entender o porque o Minotauro está enclausurado nesse labirinto.
Theseus só consegue sair do labirinto porque usa uma linha que o guia de volta para o seu consciente depois de lutar contra seu inimigo interno, imaginemos que a linha é a passagem, as nossas memórias que colecionamos ao longo da vida , ela é nossa história, que fazem parte de nós, percorremos por paredes que são as nossas emoções, sentimentos, sensações, e vamos construindo esse labirinto, mas quando conhecemos o caminho de volta entendemos que não estamos perdidos, mas entendedores de nossa própria história, entendemos e aceitamos as nossas imperfeições, os nossos talentos e usamos tudo isso para que possamos matar o que não nos fazem bem, matamos o que nos fazem sermos menos humanos, o que tentamos esconder dos outros porque nos sentimos envergonhados dele, mas quando entendemos os reais motivos de sua existência, o matamos simbolicamente, e voltamos para nosso consciente depois que entendemos o que está em nosso inconsciente, que é nosso verdadeiro eu, é onde está tudo que somos, porque quando estamos conscientes controlamos as nossas emoções, moldamos nossos sentimentos, é quando estamos dormindo para nosso inconsciente, é quando estamos verdadeiramente limitados, por isso que quando estamos "acordados" não estamos nem pensando em questões tão profundas, as coisas passam por despercebidas, só o inconsciente consegue captar o que "acordados " não nos chamam a atenção.
Theseus sai do labirinto como um herói , porque ele conquistou a soberania sobre si mesmo, ele conseguiu matar a sua animosidade, sua impulsividade entre outras questões mais profundas que o impedia de crescer, de progredir.
Quando praticamos a meditação, quando ao respirarmos e entendemos o valor de quem somos, estamos fazendo o trabalho de Theseus, estamos encarando Minotauro e lutando contra ele, porque estamos usando as nossas habilidades, a nossa amorosidade para o bem de todos , a começar por nós mesmos.
Devemos sempre estar conectados com a nossa essência, com o nosso verdadeiro EU SUPERIOR, não é um trabalho fácil porque estamos caminhando por um ambiente ainda desconhecido, só conhecemos o caminho de volta quando prestamos atenção na jornada interna, o fio que nos leva de volta é essa linha de vida, de história que construímos, logo, só conseguimos progredir quando de fato vivemos para aprender o caminho de volta, quando tomamos consciência de nós mesmos é quando reconhecemos a nossa essência.
A mitologia não é uma coletânea de histórias, é a filosofia pura, é a forma com que entendemos de onde viemos, aonde queremos ir, explicando com suas palavras mágicas e incríveis o que muitas vezes não conseguimos explicar com a clareza que merece com as palavras científicas que buscamos construir e muitas vezes não são entendidas por causa das palavras difíceis , não são todos conseguem entender, talvez as pessoas com mais sensibilidade conseguem entender a mitologia enquanto os grandes cientistas sofrem ao resolver os enigmas que se encontram nela, quer dizer, para alguns a mitologia chega com mais facilidade no inconsciente enquanto a ciência tenta explicar o que a mitologia sempre explicou.
A ciência explica os nossos eus na psicologia ,a mitologia os exemplifica com suas fantásticas histórias, afinal, não são apenas histórias, são lições, enfim, só aprendemos quando nos mergulhamos no conhecimento.
Outra história que me deixa maravilhada é a Medusa... Essa mulher símbolo perfeito que o feminismo nos apresentou, Medusa é uma mulher inspiradora que nos ensina o quanto nós nos sacrificamos por amor, por um ideal.
Uma sacerdotisa amaldiçoada porque sofreu uma violência sexual, e por amor se coloca numa condição de solidão, tenta não machucar as pessoas que ama, mas a curiosidade e os efeitos da maldição torna pedra quem se aprofunda em seu olhar, ela sacrifica sua liberdade para viver num templo, sinal de submissão e fé, mas que condenação triste por causa de sua beleza não apenas física mas moral, seus cabelos transformados em serpentes a fazem ser feia , seu olhar mortal não é apenas uma fonte de poder, mas sua própria maldição.
Vamos imaginar que o nosso olhar sobre o mundo, o nosso olhar sobre o mundo define quem somos, pessoas felizes vê a beleza no mundo enquanto os pessimistas discordam, enfim, Medusa era uma mulher de fé, sacerdotisa, aprofundou em seu conhecimento psíquico, a cabeça de Medusa era cheio de serpentes por causa da sua maldição, o que representa as serpentes?
Esse conhecimento psíquico, a intuição, as serpentes possuem veneno, mas seu veneno se transforma em soro, fonte de cura, quer dizer, a nossa mente é criação e a destruição, nós temos em nós o poder, a força necessária para nosso aperfeiçoamento, o olhar é essa luz que vem de dentro de nós, são nossos espelhos que refletem nossa alma, Medusa matava pelo olhar porque o olhar é nossa representação de nosso eu, mas quando ela morre com seu próprio reflexo, acaba ali a maldição, foi sua cura, a sua libertação.
Medusa foi uma heroína, ela sacrificou a sua liberdade por amor, ficou solitária em seu templo para que os que amavam não pudessem morrer devido a sua maldição... Ela é símbolo da feminilidade, da pureza e da força.
Seu olhar transformava em pedra quem a encarava, sua defesa era esse olhar, quer dizer, o que pensamos, o que construímos dentro de nós é nossa fortaleza, o que pensamos , a forma como agimos, é nossa autodefesa.
Quantas de nós nos sacrificamos por amor, quantas de nós nos defendemos como Medusa.
O sofrimento de Medusa era ver os outros morrendo por sua causa, do seu olhar mortal, logo, sua morte foi sem dúvida a sua libertação.
Medusa foi vítima de estupro, e a deusa a amaldiçoou porque não foi capaz de ouvir , de compreender a dor de sua sacerdotisa mas que ao saber da verdade se arrependeu, Medusa em sua dor profunda feria ao se proteger, e assim fazemos quando estamos feridos demais, reagimos com rispidez, porque não conseguimos perceber o que essa dor nos causou dureza, e ao nos depararmos com nosso reflexo, o nosso olhar nos liberta ao nos concentrarmos em nós mesmos e percebemos quem somos nós, através desse olhar porque o olhar ferido, vê feridas e a cura está no próprio olhar, mas com uma dose de amor, de compaixão e de cuidado.
Ao se ver Medusa se reconhece dura e essa visão a liberta, porque a morte como símbolo de mudança e transformação a faz a heroína que é, Medusa fora uma sacerdotisa fiel, nunca abandonou a sua missão e a sua fé, fazendo com que a deusa se arrependesse de amaldiçoá-la, ao matar os que amava , ela preferiu a solidão no templo, por amor ela se isolou.
É nesse contexto que nos fazem repensar sobre Medusa , será que somos mulheres "Medusas" nos sacrificando por amor ou nos isolamos por medo de ferir o outro? Quantas questões nos aproximam da personalidade de Medusa, uma mulher destemida, se protegia com seus olhos fatais mas esses mesmos olhos foi a sua maldição, na verdade o mito de Medusa nos fazem pensar no machismo que acorrenta nossas mentes, uma educação que culpa a mulher pelo pecado masculino.
Quantas pessoas que conhecemos já nos criticaram por nossas roupas, sobre a nossa própria sensualidade, o nosso corpo como alvo de desejo, o que nos fazem refletir que acabamos acreditando nisso, a culpa nos consome e nos tornam vítima de nós mesmos.
Quando escrevi meu livro infantil me passou pela mente tantas questões feministas, questões de que somos educadas a acreditar que somos culpadas pelas agressões que sofremos, somos educadas a acreditar que somos frágeis ou guerreiras demais, na verdade somos sobrecarregadas e nos envergonhamos de sermos vítimas, nos envergonhamos de sermos assim, por isso Medusa é um mito que nos identificamos porque ele reflete uma sociedade doentia e que contribuímos para que ele permaneça assim.
O meu livro infantil é uma psicanálise, é uma história feita para reflexão, porque a história é para atingir um olhar mais íntimo sobre nós mesmos e devemos ensinar nossas crianças a ter esse olhar para se tornarem crianças mais fortes e independentes, mais filosóficas e seguras de si mesmas, essa é a função dos escritores infantis, adentrarem em lugares que precisamos conhecer para atingirmos nós mesmos com alegria e sinceridade, só o conhecimento trás liberdade ao espírito, o que somos depois disso é o que nos fazem pessoas amorosas, pessoas de bem , pessoas iluminadas, ninguém se ilumina sem o conhecimento dentro das sombras do ser humano.
Para nos conhecermos melhor é preciso aprofundarmos na mitologia, ela nos serve de ferramenta para entender a nossa sociedade e de como chegamos até aqui.
A mitologia assim como os contos de fadas são as chaves que acessam o nosso inconsciente, elas nos fazem nos aprofundar em questões primordiais e nos fazem fazer uma análise íntima de quem somos, e porque somos quem somos, não há nada de novo que não possa ser entendido pelo passado, somos todos íntimos desse universo de possibilidades, somos quem somos porque aprendemos com o nosso passado até que moldamos e nos estruturamos.
Enquanto estamos acordados, vivendo no nosso dia a dia, estamos adormecidos, quer dizer, não acessamos o nosso inconsciente, que é quem somos de verdade, porque enquanto acordados estamos nos controlando, estamos tentando esconder as nossas verdades secretas porque nos envergonhamos do que achamos ser incompreendido ou que julgamos ser errado, logo, enquanto estamos vivendo no dia a dia, estamos longe dos nossos olhares mais profundos, e quando meditamos, quando praticamos a yoga nos conhecemos melhor, respiramos as verdades interiores,, e é por isso que a mitologia e os contos de fadas são atraentes aos que querem atingir o autoconhecimento.